Ana Markl e o 25 de Abril

Publicado a 13/07/2022, na categoria: Entrevistas, Lilliput

A propósito do lançamento do seu segundo livro infantil (depois de Onde Moram os Teus Macaquinhos?), falámos com Ana Markl sobre as histórias e as memórias do 25 de Abril. Avó, Onde É Que Estavas no 25 de Abril? parte das histórias que a autora ouvia contar quando era pequena.

Como surgiu a ideia de escrever este livro?
Perante o sucesso da primeira aventura do Manu, Onde Moram os Teus Macaquinhos?, eu e a Célia Louro decidimos que haveria aqui potencial para uma colecção de livros focada em algumas particularidades da cultura portuguesa. Esse desafio pareceu-nos suficientemente abrangente para que fizesse sentido escrever primeiro sobre expressões idiomáticas e agora sobre um momento fundamental para a nossa história e a nossa identidade enquanto povo. No fundo, como todas as crianças, esta personagem procura o seu lugar no mundo.

Nasceste cinco anos após o 25 de Abril. Durante a infância, que histórias te contavam sobre este dia?
O 25 de Abril foi vivido intensamente pela minha família, por isso os meus pais – óptimos contadores de histórias – contavam recorrentemente e de forma muito vívida as suas memórias desse dia: onde estavam, como tudo aconteceu, que música se ouvia… E contavam também o que era o país antes do 25 de Abril. Para mim, a ditadura era um verdadeiro papão e os capitães de Abril eram estrelas de rock.

E que imagem tinhas da ditadura, do tempo da “outra senhora”?
Manteve-se na minha cabeça uma imagem meio infantil de que tudo era cinzento, escuro, bafiento e triste. De que sem liberdade não havia alegria.

As estatísticas dizem que as pessoas não leem. Foi para isto que se fez o 25 de Abril?
Certamente que não se fez o 25 de Abril para que os livros sejam tão caros. Mas acho que essas estatísticas ainda não contabilizam novos hábitos de leitura, nomeadamente no meio digital. Tenho bastante fé nas novas gerações no que concerne à sobrevivência da literatura. Apesar das solicitações e dos estímulos serem muitos, apesar da busca por uma gratificação imediata ameaçar o prazer lento e saboreado da leitura, noto uma grande predisposição para o consumo de conteúdos relacionados com a palavra – como podcasts ou audiolivros. Por isso, vamos tentar não cair no discurso de que “no nosso tempo é que era bom”, senão não tarda estamos como aquela malta que acha que devia haver um Salazar a cada esquina.

É preciso uma “revolução” na literatura para crianças?
Acho que não é preciso propriamente uma revolução porque estamos muito bem encaminhados, mas há muito produtos culturais para crianças – não só livros – que são verdadeiros atentados à imaginação. As crianças, enquanto leitores, não podem ser tratadas com condescendência. Elas é que vão dar sentido às palavras dos adultos, elas são capazes de reescrever livros – portanto essa abertura deve ser tida em conta, bem como o seu sentido de humor, sinceridade e acutilância. São um público muito desafiante, muitas vezes tratado como um público fácil, que papa tudo desde que tenha uma bonecada qualquer. Não é bem assim. Aliás, se o meu filho de 2 anos fosse crítico literário, muitas carreiras seriam destruídas.

 

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