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Iniciativa — Biblioteca Andante

Publicado a 18/05/2022, na categoria: Penguin Random House Grupo Editorial Portugal

Sobre a importância de ouvir ler

Isabel Praça, professora bibliotecária, fala-nos da Biblioteca Andante, um projeto que leva os livros e as histórias contadas a escolas do concelho de Loures. As ações de animação de leitura pretendem proporcionar um contacto estreito com o livro, enquanto objeto, e com as histórias, enquanto viagens da imaginação cheias de novas possibilidades. Oferecer a experiência única e insubstituível de escutar uma história.

Pediram-me que contasse como é trabalhar em escolas públicas, com miúdos dos 3 aos 11 anos, na área da mediação de leitura.

Esta história começa com uma criança, que como outras, cresceu a tentar dar sentido ao mundo que a rodeava, que teve uma tia que lhe contava e lia imensas histórias em voz alta, horas a fio. Anos mais tarde, ao ler o artigo de Paulo Freire “A importância do ato de ler”, reflexão para compreender o ato da leitura enquanto interpretação da palavra escrita e descodificação do mundo que nos rodeia, tomei consciência da importância desta vivência nas relações que estabeleci com o mundo, com a leitura e com o conhecimento.

Durante anos e ainda agora, quando leio, oiço interiormente o ritmo, a entoação, o tom da voz que me leu lá longe, no tempo da infância e da adolescência. A voz interior que me acompanha na leitura tem memórias sonoras desta voz, que me facilitam a compreensão, dão prazer e tornam a leitura familiar e confortável.

Depois houve o João Villaret, o Mário Viegas, o teatro no Filipa [Liceu Filipa de Lencastre], na Gulbenkian e no TUT [Teatro Académico da Universidade de Lisboa], o António Fontinha, o Ângelo Torres, a Cristina Taquelim, o Rodolfo Castro, todas estas vozes são parte da minha voz interior que oiço sempre que leio.

Preciso, também, que saibam que acredito que o acesso aos livros e à leitura é fundamental na construção de uma sociedade democrática e livre, e que só um cidadão que teve acesso à aprendizagem da leitura pode escolher, em consciência, se quer ou não ser leitor.

É muito mais fácil estar disponível para o que nos é prazeroso do que para o aborrecimento, e ler tendo por base memórias de vozes felizes transforma a leitura numa experiência íntima e emocional.

É por causa destas vivências e convicções que se criou o projeto Biblioteca Andante, que leva livros e animações de leitura a escolas sem biblioteca da parte ocidental do concelho de Loures. Foram escolhidos livros que estão mesmo a pedir que se gostem deles e deem prazer na leitura. As histórias e as ilustrações às vezes espantam, assustam, fazem rir ou desconcertam. Os momentos de animação de leitura procuram dar voz a estas histórias com a consciência da sua importância na criação de leitores que têm prazer a ler.

Participam neste projeto vários educadores e professores, apoiados pelo Plano Nacional de Leitura, pela Rede de Bibliotecas Escolares, pela Confap, pela Biblioteca Municipal José Saramago, pela Câmara Municipal de Loures e pela Direção do Agrupamento de Escolas Luís de Sttau Monteiro. Obrigada a todos, sem vocês nunca seria possível.

O dia da Biblioteca Andante nas escolas significa ouvir e contar histórias, ler livros e falar sobre eles ou sobre o que eles nos trazem. Para isso, levamos caixotes de livros a miúdos das escolas do 1.º ciclo e do jardim de infância, para que lhes peguem, cheirem, folheiem, para que se sentem, andem, deitem, rebolem e façam o que lhes apetecer.

Queremos que se envolvam com os livros material e imaterialmente, sozinhos, a pares, em pequeno ou em grande grupo. Que levem para casa os livros, enquanto memória ou objeto, que os partilhem em família, que os requisitem, que falem sobre eles, que opinem sem constrangimentos ou que não digam nada.

Procuramos criar contextos de leitura significativos, surpreendentes, que marquem as crianças com que nos encontramos. Para que a leitura se instale tem de despertar a curiosidade, afinar os sentidos, levando o leitor a disponibilizar-se para ouvir e se envolver. Este processo começa com um olhar de soslaio, um gesto de aproximação, um riso nervoso, uma conversa paralela, uma atenção dividida que progressivamente se torna numa relação de atenção e confiança.

O leitor deixa os limites do real e relaciona-se com piratas, fadas, guardadores de rebanhos, princesas e bruxas. Ouve as suas histórias, imagina o que estão a sentir e o que poderão fazer. Ao viver estas aventuras, encontra-se com os outros, descobre-se e começa a contruir sua voz interior.

Atenção, a leitura torna-nos curiosos, insatisfeitos e atrevidos!

Isabel Praça, Professora-bibliotecária no Agrupamento de Escolas Luís Sttau Monteiro (Loures)

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